Sim, seu porco imundo, estou falando com você!
Largue essa porra de cerveja e arraste sua pança ignóbil
até aqui.
Vamos encarar os fatos. Nossa vida é uma merda.
Não! Não ouse me dar as costas.
15 anos que você me enrola, jura que vamos ter uma vida
decente, que vamos nos mudar desse muquifo.
O que temos? Me diga! O que temos?
Eu tenho que labutar feito uma desgraçada para pagar as
contas desse pardieiro que nos acostumamos a chamar de casa, enquanto você fica
aí, esparramando suas banhas nesse sofá lascado e enchendo a cara.
Eu tinha uma vidinha razoável. Não era lá muito grandiosa,
de fato, mas qualquer coisa é melhor que isso aqui. E eu fui burra o suficiente
para deixar tudo para trás e me casar com você. Ora, naquela época você era só
um rapazinho alto e esquálido. Era de dar dó. Mas eu te amava, porra. Eu te
amava.
E você tinha tanto talento. Era um escritor muito
promissor. Ainda sinto falta de quando você sentava nesse mesmo maldito sofá,
com seu cigarro, seu caderno com capa de couro e sua caneta e passava horas
rabiscando, com aquele ar blasé que eu tanto adorava. Às vezes parecia que você
ligava mais para sua arte do que para mim. Mas e daí? Eu tinha uma estúpida
fantasia de ser mulher de um renomado escritor. Isso me excitava deveras.
Mas agora você é só gordo, velho e inútil.
Estou indo. Dessa vez eu estou indo. De verdade. E não vou
voltar como já fiz antes. Não sou tão velha assim. Ainda tenho chances de dar um jeito na minha vida.
Não adianta gritar, espernear. E se quiser se matar, ótimo. Ninguém vai sentir sua falta mesmo. É até um favor que você faz. Um indigente a menos no mundo.
Não adianta gritar, espernear. E se quiser se matar, ótimo. Ninguém vai sentir sua falta mesmo. É até um favor que você faz. Um indigente a menos no mundo.
Adeus, Miguel. E até nunca mais.